[Resenha] O Escaravelho do Diabo

O que esperar da adaptação cinematográfica da famosa história de suspense infanto-juvenil brasileira pela Globo Filmes? Confira em nossa resenha de hoje.


Eu, como boa parte dos jovens nascidos na década de 80, tive o prazer de começar a trilhar o caminho da literatura de ficção através da "Coleção Vagalume", uma série de livros de poucas páginas e fácil leitura voltada para o público infanto-juvenil que começou a ser publicada em nosso país por volta da década de 1970 pela editora Ática, chegando a vender em torno de 7,5 milhões de exemplares, sendo por fim responsável por formar uma legião de adultos leitores. Para tanto, a coleção incentivava o trabalho de autores renomados em livros adultos para escrever para estudantes de nível fundamental e médio. Gente como Marcos Rey, autor de "O Mistério dos 5 Estrelas", Marçal Aquino em "A Turma da Rua Quinze", Maria José Dupré em "A Ilha Perdida" e, finalmente, Lúcia almeida de Machado em "O Escaravelho do Diabo" que recentemente ganhou versão cinematográfica dirigida pelo estreante (em cinema) Carlo Milani.

O filme conta a história de Alberto (Thiago Rosseti) que juntamente com o Inspetor de polícia Pimentel (Marcos Caruso) investiga os crimes de um misterioso assassino de ruivos na pacata cidade de Vila das Flores após encontrar o seu irmão Hugo(Cirilo Luna) assassinado com uma espada espanhola cravada no peito. 



Como toda adaptação de mídias, a história é submetida a alterações. A primeira delas diz respeito justamente ao rejuvenescimento do protagonista, que passou de um universitário de medicina no original para um pré-adolescente estudante de ensino fundamental, em uma tentativa de tanto adequar o filme para a nova geração quanto como fator imersivo tentando emular no público adulto e fã do material de origem um sentimento viagem ao passado, para a época em que os mesmos leram o livro pela primeira vez. O Inspetor Pimentel também ganhou uma certa profundidade até então inexistente, em vistas de humanizá-lo. Também para modernizar o filme tablets, videoconferências, ferramentas de busca são exibidos em profusão, o que curiosamente contrasta com o aspecto atrasado da cidade interioresca. E por fim, arcos de história completos foram omitidos em virtude de um maior dinamismo na história. Todas decisões conscientes e acertadas, mas que careciam ser melhor executadas.



Primeiramente, ter um protagonista de 13 anos, além do caráter comercial na definição do público-alvo parece uma decisão acertada para um filme de suspense por colocar um personagem tecnicamente indefeso e naturalmente desacreditado por adultos no centro da ação. Curiosamente, tal mudança estrutural no personagem acaba não sendo seguida em muitas situação pelo longa, que diversas vezes teima em tratar o jovem Alberto com mais importância do que deveria. Particularmente, parece inconcebível uma criança deter tanta liberdade de acesso a um inspetor de polícia. Porém, devo dedicar elogios ao Thiago Rosseti, que para um ator mirim brasileiro, desempenhou um papel satisfatório ao viver o Alberto, embora eu realmente gostaria de ver um pouco mais de empenho do jovem em momentos de maior tensão, como nas cenas que sucedem o descobrimento da morte do irmão ou que em outras sequencias que exigem um maior esforço emocional do ator.



Já Marcos Caruso, um dos nomes consagrados da TV Brasileira a integrar o elenco do filme, embora atraia as atenções nas cenas em que aparece, conduz o seu personagem de forma bem apática e mesmo seus problemas de saúde, criado pelos roteiristas Melanie Dimantas e Ronaldo Santos para humanizar o personagem naturalmente unidimensional, os quais deveriam se apresentar como elementos cômicos no início e dramáticos, do meio para o fim do filme, acabam não servindo nem para uma coisa, nem para outra, entregando um personagem mais caricato do que o retrato realista que eles pretendiam traçar. Na verdade, dá para notar as partes da narrativa criadas sem interferência da obra original, pela pobreza nos diálogos.. A cena de Pimentel revelando para o parceiro Almeida(Augusto Madeira) sobre o seu problema, por exemplo, é de uma pieguisse que deixa claro a experiência do diretor na teledramaturgia.



Mas de forma geral, o roteiro alterna entre bons e maus momentos. Bons, quando o roteiro cria situações criativas para adaptar sequências de ação (por vezes datadas da época dos livros), como a ótima sequência do jornalista Louzeiro (Bruce Gomlevsky, perfeito) ou a montagem do ataque à Raquel (Bruna Cavalieri). Maus, quando temos o uso excessivo de flashbacks que mais atrapalham do que causa a confusão esperada no expectador, as soluções extremamente simples para os mistérios do roteiro e um final anticlímax que te faz suspirar de decepção. Mas, talvez a maior causa dos problemas de "O Escaravelho do Diabo" seja a direção inexperiente que falha em unir tantos elementos e conceitos com o dinamismo esperado do gênero de suspense. Talvez um esmero ainda maior na direção pudesse resultar em uma obra-prima do cinema nacional, mas isso fica para a outra oportunidade.



De toda forma, ficam aqui os méritos para "O Escaravelho do Diabo" pela coragem de enveredar para um gênero tão pouco explorado em solo brasileiro como o suspense, principalmente em se tratando de um filme infanto-juvenil sobre Serial Killers (!?!) e fazendo um trabalho decente com ele, a despeito das falhas mencionadas. E fica aqui a torcida para que mais obras do gênero peguem carona na iniciativa de Milani e Cia, corrigindo os seus problemas e levando o cinema brasileiro para um novo patamar.

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